Pantufa Chronicles

  Diário de bordo, 01 de Setembro - Em algum lugar do Universo...   E hoje o dia foi um pouco melhor, encontramos calor... Hoje enfim tivemos sorte por essa fenda que entramos. O capitão parece melhor, aparentemente dormiu a tarde toda com seu inseparável cantil de café.  Dias de atividades a mil, quase não temos tempo para registrar as memórias, mas aparentemente a Pantufis-2 passa por calmos ventos... Aqui registro meu desejo ver Capitão Quirq bem o suficiente para preparar a comida de sua terra nativa para a tripulação... nem só de chá vive o homem Marujo Botinhas de Pelúcia

Nave Pantufis-2, data astral 28 de agosto 2020. Estamos novamente rodeando a galáxia de Cozinha-Centauri, em proximidade do sistema orbital Fog- A0 onde precisaremos parar a Pantufis-2 por um tempo, enquanto os motores se recarregam extraindo cafóleo do planeta. Nossa nave passou maus e tristonhos bocados durante muitas viagens anteriores. Anos luzes de azar cosmico e chuva de meteoros da duvidosa trajetória alvejaram o metal externo, deteriorando até os escudos que em seguida necessitaram ser reforçados com cinysium e pessimysium em várias camadas de material. A tripulação acostumou-se com um tipo de escuridão induzido pela cor marrom dos meteoros que cobriram as janelas da Pantufis-2 e deixaram um siléncio sepulcral até pelos corredores da nave. A tripulação pegou o costume de ficar nos alojamentos, só fazendo as tarefas minimas necessárias quando iam em plancha, para voltar logo a olhar as paredes das cabines. Apesar da calma reinante, estava claro que a tripulação estava se ilhando...

Diário de bordo, 25 de Agosto -  Em algum lugar da galáxia Mais um dia gélido se passa, e com ele a esperança de minha terra com aquelas longas primaveras, passarinhos cantando e frutas... ah, as frutas. A tripulação passa bem, apesar dos pesares, conseguimos sobreviver bem com nossos reservatórios de comida cheios, porém temo pelos dias que virão, tendo como companhia os terríveis ventos uivantes.  Ouvi as histórias do Capitão Quirq sobre as peculiaridades da vida nativa e suas músicas estranhas em uma de suas expedições. Consegui por um minuto imaginar a dor que esse homem passou em terras tupinivikings: olhos marejados, dentes semicerrados... Então, subitamente ele se recolheu com seu cantil de café para dentro da cabine e em seguida escutamos um leve Chopin o resto da noite... Capitão Quirq é um grande homem. Marujo Botinhas de Pelúcia  

Diário de bordo, 24 de Agosto - Em algum lugar da Terra... Consumida pela fome, decidi me lançar em estranhas terras em busca de qualquer coisa que preenchesse esse vazio... Esperando não acabar virando comida de alienígena. A vida nativa não parece nada agradável, olhos desdenhosos, passos apertados, porém parecem se habituar muito bem a esse clima. Estranhamente vejo pessoas com o mínimo de tecido, enquanto limpo minhas lágrimas que a essa altura, já viraram cubos de gelo. Tudo de repente pareceu embaçado e minha respiração ficou ofegante... penso ser consequências severas da fome, mas lembrei da péssima combinação que é usar máscara com óculos, oh céus...  Consigo pegar o básico para minha estrita sobrevivência. Optei por não atiçar meus instintos e usar de força para caçar o deus local "Coxinha com catupiry"... Apesar do mal estar, por hora, fiz o certo... Mas até quando?   Marujo Botinhas de Pelúcia

Na impossibilidade de fazer algo melhor, consumidos pela fome e pela preguiça cósmica, decidimos relatar aqui estas aventuras, com a esperança de que não sejam as últimas páginas desta viagem.  O diário poderia se interromper tragicamente por causa da falta de café ou de chá, juntamente ao esforço titánico necessário para alcançar os suprimentos fundamentais que ficam longe daqui: alguns anos luz a pé, na galáxia de Cozinha-Centauri. A órbita de Fog-A0 também não ajudará muito a tripulação faminta, enquanto o forno já tornou-se uma quimera longinqua num horizonte improvável.  Navegamos com um véu de sono nos olhos cansados, mas confiantes de que, apesar de tudo, sairemos das trevas...  Capitão Quirq